No dia 17 de março, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.070, que consolida, administrativamente, a situação que já havia sido reconhecida pela justiça em 2018.
Para o perfeito entendimento, faz-se necessário voltar no tempo para compreender o Artigo 39 da Lei 11.196, de 21 de novembro de 2005, conversão em lei da chamada MP do Bem que, foi a Medida Provisória nº 255, de 1º de julho de 2005, o qual, literalmente, diz o seguinte:
“Art. 39. Fica isento do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente no País na venda de imóveis residenciais, desde que o alienante, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição de imóveis residenciais localizados no País”.
Trata-se, portanto, de uma isenção, o que, em acatamento ao disposto no Código Tributário Nacional, Lei 5.172 de 25 de outubro de 1966, em seu artigo 111, inciso II, tem-se que: “interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção”.
Em outras palavras, não cabe, através do uso de outras formas de interpretação admitidas pelo Direito, que não seja a literal, a extensão ou a restrição do alcance da Lei. Pois bem, como ocorre com boa parte das leis que envolvem matéria tributária, a Receita Federal baixa uma instrução normativa oferecendo, digamos, detalhes operacionais que permitam o cumprimento da Lei.
Em qualquer situação, não se admite inovar, ou seja, ir além do que a lei prevê, mas apenas normatizar, tratar da operacionalização do cumprimento da norma. Para tanto, foi publicada a Instrução Normativa SRF nº 599, de 28 de dezembro de 2005, com o intuito de normatizar os artigos 38, 39 e 40 da Lei 11.196/2005. E aqui começam os problemas!
A Instrução Normativa SRF nº 599 trouxe em seu artigo 2º, parágrafo 11, a seguinte vedação: “(...) o disposto neste artigo não se aplica, dentre outros, à hipótese de venda de imóvel residencial com o objetivo de quitar, total ou parcialmente, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante”.
Trata-se, claramente, de uma restrição não prevista no texto da lei que se pretendia regulamentar e um duplo equívoco jurídico – a instrução normativa estava inovando, ou seja, criando regra nova não prevista na Lei regulamentada e ainda restringindo uma interpretação que, conforme dito acima, poderia ser apenas literal.
Não tardou para que contribuintes inconformados buscassem o socorro na justiça exatamente por essa exacerbação contida na Instrução Normativa 599/2005.
A discussão chegou ao Superior Tribunal de Justiça através do Recurso Especial nº 1.668.268/SP, sob relatoria da ministra Regina Helena Costa, da Primeira Turma, cujo julgamento, de 13 de março de 2018, publicado no Diário de Justiça Eletrônico (STJ), em 22 de março, assim determinou “a isenção prevista no art. 39, § 2º, da Lei n. 11.196/05, alcança as hipóteses nas quais o produto da venda de imóvel por pessoa física seja destinado, total ou parcialmente, à quitação ou amortização de financiamento de outro imóvel residencial que o alienante já possui”.
Com a decisão desfavorável à Fazenda Nacional, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional emitiu, em 6 de agosto de 2018, a Nota SEI nº 48/2018, com a inclusão deste tema na lista de dispensa de contestação e recursos, e propôs a edição de Ato Declaratório da PGFN sobre a matéria, seguindo os ditames da Lei 10.522/2002.
Ainda assim, apesar de todos os atos legais acatando a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), restava na Instrução Normativa SRF 599/2005 a vedação ao uso do produto da venda de um imóvel residencial na quitação de um imóvel financiado que o alienante já possuía no ato da alienação.
A Instrução Normativa RFB 2.070/2022 veio corrigir, de forma definitiva, essa normatização indevida, revogando o Inciso I do parágrafo 11 da IN 599/2005.
A IN 2070/2022 trouxe também o acréscimo do inciso II ao parágrafo 10 da IN 599/2005, que permite tanto a venda como a aquisição de imóvel residencial em construção ou na planta.
Importante salientar que se trata da venda de um imóvel residencial em construção, ou seja, ainda sem o habite-se, e a compra de imóvel na mesma situação, mas não significa que a venda de um imóvel residencial para a construção de um imóvel residencial já possuído pelo alienante esteja contemplado.
Nesse sentido, o caderno de perguntas e respostas do IRPF 2022, o Perguntão 2022, disponibilizado pelo fisco nesta semana, trata do assunto em sua pergunta 556.
Fonte: Contábeis